Só 6 a cada 100 reclamações são ressarcidas por ‘seguro da bolsa’

Com o aumento do número de pessoas físicas investindo na bolsa, é natural que a proporção de problemas enfrentados pelos investidores acompanhe esse movimento. Contudo, a maioria esmagadora de reclamações oficializadas ao órgão competente não apresenta fundamentos sólidos.
Dados da BSM Supervisão de Mercados mostram que dos 423 processos julgados no primeiro semestre apenas 27 (6,4%) foram julgados procedentes. Assim, de cada 100 reclamações de investidores que se tornaram processos avaliados pela BSM, apenas 6 tiveram direito de acessar o Mecanismo de Ressarcimento de Prejuízo (MRP), espécie de “seguro de operações na bolsa”.
O MRP é um mecanismo mantido pela B3 e administrado pela BSM Supervisão de Mercados que garante ao investidor ressarcimento de até R$ 120 mil em casos em que, comprovadamente, houve prejuízo causado por erros ou omissões de participantes do mercado, como corretoras ou a própria bolsa. A BSM avalia as reclamações e toma uma decisão sobre o caso. Se não ficar satisfeito com a resolução, o investidor pode recorrer à CVM (Comissão de Valores Mobiliários).
Segundo André Demarco, diretor de autorregulação da BSM Supervisão de Mercados, a falta de conhecimento ainda leva investidores a buscar o ressarcimento sem justificativa plausível. Tanto que 28% das reclamações são por liquidação compulsória de ativos.
Liquidação compulsória é quando as corretoras vendem ativos dos investidores para cobrir operações realizadas por eles que estejam dando prejuízo em volume que comprometa boa parte das garantias depositadas pelos clientes. É uma espécie de “freio de mão” usado para interromper uma movimentação do investidor no mercado financeiro e recompor as perdas assumidas.
Isso é previsto nos contratos de intermediação de serviços das corretoras, está dentro das regras do mercado de capitais e, para operar, os investidores aceitam essas diretrizes. O problema é que muita gente dá “ok” sem a devida atenção ao conteúdo do contrato aceito. Como a operação de zeragem compulsória está dentro das regras do jogo, dificilmente o investidor consegue obter vitória.
“Não é algo novo, mas também não é simples de entender. O processo de negociar em bolsa exige processo de conhecimento do investidor. É preciso entender que alguém está gerenciando esse risco por você, mas não para você. O investidor deveria ter lido as regras para ele mesmo fazer a gestão e o monitoramento disso.”
Qualquer negociação na B3 é passível de zeragem compulsória, quando não atendidos os requisitos mínimos de garantia, mas é mais comum que esse tipo de gatilho seja acionado em operações mais ágeis, como “day trades”.
“Day trades” são operações de compra e venda de ativos – podem ser ações ou contratos futuros de índice e de dólar – que começam e terminam no mesmo dia, às vezes em questão de segundos. O lucro vem quando, após descontados os custos, o preço médio da venda é maior que o da compra.
O número de reclamações enviadas ao MRP caiu 19% no primeiro semestre deste ano, para 295, em relação ao segundo semestre de 2021. Na comparação com o mesmo período do ano passado, a queda no número de reclamações foi de 32,80%. Nos últimos 12 meses, até julho, as reclamações protocoladas na BSM somaram 644.
A BSM concluiu a avaliação de 805 processos nos últimos 12 meses, até julho. Os valores reclamados nesse período eram de R$ 20.506, em média. Já os valores efetivamente pagos ficaram em R$ 15.274, em média.
A atualização de processos dentro da BSM fez com que os trâmites das reclamações ganhassem maior agilidade. Foram 296 casos concluídos no segundo semestre de 2021 e 423 nos seis primeiros meses deste ano, uma elevação de 43%.
Demarco conta que esse é um resultado de mudanças de processos dentro da própria BSM para ganho de agilidade na avaliação das reclamações. “Ficamos com uma equipe dedicada a esse trabalho e chegamos aonde eu queria, que é atender investidor e corretora de forma mais eficiente”, afirma.
O objetivo até o fim do ano é “zerar o estoque” de reclamações, tornando o funcionamento da BSM “mais adequado para atender o mercado”.
Demarco conta que a BSM tem feito um “trabalho de formiguinha e contínuo” de educação financeira para evitar que os investidores aprendam as regras do mercado financeiro só depois de se machucarem em campo. “Não precisamos tornar a jornada dele mais tortuosa”, diz.
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